Haydn foi o último dos grandes compositores a ter um emprego fixo em uma corte por longa data: nas três últimas décadas de sua vida, ele esteve a serviço do Príncipe de Esterházy, em um palácio na Hungria. Seu prestígio, contudo, corria toda a Europa, e seu bom patrão permitia que ele também aceitasse encomendas externas. A Sinfonia nº 74, escrita no auge de sua carreira, foi publicada em Londres por um editor que Haydn conhecera por meio do embaixador inglês em Viena.
Haydn é considerado o “pai da sinfonia”. Embora não tenha propriamente inventado o gênero, suas mais de cem sinfonias cunharam o modelo que seria seguido, do Classicismo aos dias de hoje. A partir de Haydn, entendemos uma sinfonia como uma obra para orquestra, sem solista, com quatro movimentos de andamento contrastantes – forma que a Sinfonia nº 74 ilustra muito bem. O primeiro movimento é em geral em andamento rápido (aqui um Vivace Assai); o segundo, lento (no caso, um Adagio Cantabile); o terceiro, uma dança (o típico Minueto e Trio); e o quarto, novamente um andamento rápido (Finale: Allegro Assai). O primeiro e o último movimentos normalmente exploram a forma-sonata, que melhor transpõe para a música o pensamento racional iluminista de apresentação de duas ideias contrastantes, seguidas pelo desenvolvimento de seus elementos, que desembocam na reafirmação conclusiva da seção inicial. A partir dessas estruturas, que no Classicismo passaram a ser conhecidas tanto pelos músicos quanto pelo público, o interesse composicional reside, justamente, na sua variação a cada obra.
JÚLIA TYGEL
Doutora em Musicologia (USP), pianista, é Assessora Artística da Osesp.
JOSEPH HAYDN
Sinfonia nº 74 [1946]
Vivace Assai
Adagio Cantabile
Minueto e Trio
Finale: Allegro Assai
23 MIN
Ludwig van Beethoven começou bem cedo a dar o que falar, graças a seus dons como instrumentista, que aos doze anos já lhe valeram a nomeação como cravista da orquestra da corte de Bonn. Mais tarde, ao observar como o famoso abade Johann Franz Xaver Sterkel lidava com o piano, o jovem artista tomou consciência das delicadas sutilezas do instrumento.
Seus progressos foram tão notáveis que, em 1791, Carl Ludwig Junker (1748-97) confessava que ouvira “um dos maiores pianistas, o querido e bom Beethoven. [...] Sua maneira de tratar o instrumento é tão diferente da habitual que dá a impressão de que ele atingiu esse nível de excelência seguindo caminhos que descobriu sozinho”. Se acreditarmos nesse testemunho, Beethoven desde cedo teria conseguido criar uma maneira muito pessoal de tocar, o que sem dúvida o ajudou a obter um lugar privilegiado junto à aristocracia vienense, quando foi morar na capital austríaca, munido apenas de uma carta de recomendação do conde Waldstein.
O piano se impôs naturalmente como veículo de seus primeiros pensamentos musicais e se tornou fiel companheiro. No entanto, sua relação com o instrumento evoluiu ao longo do tempo. [...] Os progressos na fabricação do instrumento certamente contribuíram para essa evolução: seus primeiros dois concertos foram pensados para um piano idêntico ao de Mozart, ao passo que os demais já preveem um instrumento mais poderoso e sonoro, capaz de sustentar os densos diálogos com o conjunto da orquestra [...].
O Concerto nº 3 em Dó Menor, Op.37, foi redigido entre 1800 e 1803 e apresentado pela primeira vez em cinco de abril de 1803, com Cristo no Monte das Oliveiras e a Sinfonia nº 2. Publicado em Viena no ano seguinte, foi dedicado ao príncipe Louis Ferdinand da Prússia, também excelente pianista.
Com ele, Beethoven se despede das obras concertantes de caráter semi-improvisado para criar partituras perfeitamente disciplinadas tanto no plano da composição quanto no da construção formal. O jornalista do Allgemeine musikalische Zeitung não estava errado ao declarar que esse concerto era “uma das obras mais importantes do distinto mestre”.
O “Allegro con Brio”, ritmicamente intenso, é uma verdadeira sinfonia, na qual o piano toma todas as iniciativas. O lirismo do “Largo”, na tonalidade distante de Mi Maior, acena para o movimento equivalente do Concerto nº 2, mas se expande de maneira bem mais interiorizada. O rondó final, por sua vez, dá a ouvir inflexões autoritárias e militares não desprovidas de humor; o motivo principal do refrão, aliás, será retomado e um pouco suavizado no rondó do Concerto Triplo, Op.56. [...]
JEAN-PAUL MONTAGNIER
É professor de Musicologia na Universidade de Lorraine, professor-adjunto na McGill University (Montreal) e membro do Instituto de Pesquisa em Musicologia do CNRS (França). Texto do encarte do CD Beethoven — Complete Piano Concertos (Harmonia Mundi, 2010), com Paul Lewis e a Sinfônica da BBC, sob regência de Jirí Belohlávek, publicado na Revista Osesp em 2016 e reproduzido sob autorização. Tradução de Ivone Benedetti.
LUDWIG VAN BEETHOVEN
Concerto nº 3 em Dó Menor
Allegro con Brio
Largo
Rondó: Allegro
34 MIN