EDVARD GRIEG [1843-1907]
Quarteto de Cordas nº 2 em Fá Menor - Inacabado [1891]
SOSTENUTO. ALLEGRO VIVACE E GRAZIOSO
ALLEGRO SCHERZANDO
16 MIN
PHILIPPE MANOURY [1952] /COMPOSITOR VISITANTE
Quarteto de Cordas nº 1 - Stringendo [2010]
15 MIN
/INTERVALO
JEAN SIBELIUS [1865-1957]
Quarteto em Ré Menor, Op.56 - Vozes Íntimas [1909]
ANDANTE. ALLEGRO MOLTO MODERATO
VIVACE
ADAGIO DI MOLTO
ALLEGRETTO (MA PESANTE)
ALLEGRO
33 MIN
GRIEG
Quarteto de Cordas nº 2 em Fá Menor - Inacabado
Estamos acostumados que as obras de arte inacabadas sejam fruto dos últimos esforços criativos dos compositores, e que a morte súbita, quase sempre, seja a razão para que elas não sejam completadas.
Bem diferente da situação do Quarteto n° 2 de Edvard Grieg, cujos primeiros dois movimentos ficaram prontos em 1891. Depois daquela data, o Quarteto ficou guardado, e apesar das frequentes e documentadas declarações do compositor acerca de sua intenção de completar os movimentos faltantes, o Quarteto ficou inacabado até sua morte, em 1907. O motivo principal dessa distância persistente entre criador e obra, foi o caráter sereno e leve do Quarteto, que não conseguia se encaixar mais no estado físico e psicológico de Grieg, tanto que em uma carta ao seu editor Peters, em 1903, podemos ler as seguintes palavras: “em várias ocasiões tive a vontade de completar esse Quarteto, mas os últimos anos me desgastaram tanto, seja fisicamente como espiritualmente, que não senti mais aquela motivação interior para conseguir voltar a trabalhar nele”.
Assim, em 1907 Edvard Grieg nos deixou, e pouco depois os dois movimentos existentes do Quarteto foram adquiridos pelo amigo de família Röntgen, que os publicou para a editora Peters. O próprio Röntgen organizou uma primeira execução, em sua casa, numa situação bem especial, da qual temos uma descrição minuciosa numa carta enviada à viúva de Grieg, Nina: “Foi uma estranha sensação tocar a música de Edvard, e pensar que ele não teve a possibilidade de escutar as notas que nós fazíamos viver pela primeira vez. O grande pianista Harold Bauer tocou o primeiro violino, Pablo Casals o segundo, segurando o instrumento entre as pernas, como se fosse seu amado violoncelo. Eu toquei a viola, e a esposa do Casals o violoncelo, de uma forma absolutamente admirável”.
Assim, temos hoje dois movimentos que são um pequeno retrato do lado sereno de um compositor um tanto inadequado para com sua época. Um conservador modesto e pacífico, sem grandes ambições e com uma atração forte para a vida tranquila. Por isso, frequentemente subestimado, mas não por nós do Quarteto Osesp, que no gosto pela melodia e pela música descritiva, enxergamos os fundamentos de seus princípios artísticos, simples, mas genuínos e preciosos.
MANOURY /COMPOSITOR VISITANTE
Quarteto de Cordas nº 1 — Stringendo
Existe um risco em escrever um texto sobre uma obra musical que se conhece só como ouvinte, sem ter ainda começado a trabalhar nela para a performance desta noite: o risco é de chegar ao concerto com opiniões diferentes das iniciais, pois a visão de um instrumentista que convive dias, semanas e meses com a obra, pode mudar bastante daquela inicial formada pela audição.
Por outro lado, existem algumas características que são muito claras, neste Quarteto: primeiramente, vale enfatizar o contraste brutal com a escrita tradicional de Grieg. Em Manoury quase não há melodia, ou melhor, ela é fragmentada em células mínimas, que no início da peça se projetam no ar sem uma aparente coerência, mas que, conforme seguimos o caminho da composição, são atraídas e se juntam cada vez mais, como em um vórtice cada vez mais rápido. Aqui nasce o título da obra: Stringendo, a “chave” formal da peça, que soa muito complexa de se executar, pois a escrita fragmentada pode parecer sem rumo, quando na realidade o rumo é esse vórtice cada vez mais estreito e rápido. Por fim, é de se apontar o sofisticado uso de efeitos especiais, como pizzicatos, glissandos, e notas tocadas de forma absolutamente não convencional, fazendo desta obra também um estudo de inúmeras possibilidades sonoras dos quatro instrumentos.
SIBELIUS
Quarteto em Ré Menor, Op.56 — Vozes Íntimas
Em 1907 Edvard Grieg falecera, levando consigo os últimos resquícios de um melodismo inatual e talentosíssimo; somente dois anos depois, outro compositor nórdico, Jean Sibelius, com visões musicais bem distintas, escreveu seu único Quarteto do período maduro. Decidiu-se por um título em latim: Voces Intimae, para enfatizar o lado arcaico e profundamente íntimo da peça, tanto que, em uma carta para sua esposa, ele escreveu que “quer trazer um doce sorriso na hora da morte”.
Já o início da obra, com suas frases alternadas entre violino e violoncelo, é como um canto suspenso no tempo e no espaço. A atmosfera é fria e desolada. E ao longo do primeiro movimento não muda, sendo ele o retrato de uma alma perdida e que não consegue encontrar-se.
O curto segundo movimento, frenético e glacial, nos leva para as paisagens que cercam a casa de Sibelius, a famosa Ainola, assim chamada para homenagear sua amada esposa Aino. É ainda um inverno da terra, e da alma.
Tudo muda com o terceiro movimento, que é o sorriso do qual Sibelius fala. Das paisagens externas, agora entramos no aconchego da casa, e finalmente temos calor humano, com temas não mais interrompidos, mas agora sim longos, e melodias solares que preparam o quarto movimento de dança, que ainda mantém o sorriso no rosto.
O quinto e último movimento encerra com ímpeto um Quarteto sofisticado e pouco comum, no qual reconhecemos a unicidade compositiva de Sibelius, que, assim como nas Sinfonias, consegue aqui criar um universo sonoro que é só dele, e que apesar das numerosas influências, permanece fiel a um idioma artístico entre os mais genuínos que os Países do Norte da Europa já doaram para o mundo.
EMMANUELE BALDINI
Spalla da Osesp desde 2005, integra o corpo docente da Academia da Osesp,
o Quarteto Osesp e o Trio Arqué. Em 2017 assumiu também
a direção musical da Orquestra de Câmara de Valdivia, no Chile.
Leia a entrevista com Philippe Manoury, realizada por Renato Roschel, aqui.